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quarta-feira, 23 de maio de 2018

à mim, quero ter efeito de água de cachoeira. aquela que com sua força arranca qualquer sujeira que um corpo pode ter.

quinta-feira, 17 de maio de 2018

cartografando minha estratégia poética: próteses

Sou filha-neta de uma mulher negra que foi subjetivada por mecanismos de controle que a fizeram , ao longo de sua vida, atribuir intensa importância aos modos que ela e o outro se veste. Desde a minha infância, moro com está minha vó paterna; e com seu esposo, meu avô. De modo singular, no decorrer de minha vida fui acessando e incorporando tais preocupações com a minha estética e hoje percebo os desdobramentos destes processos em minha produção artística.

Recordo-me que em minha adolescência, conversando com uma prima querida sobre minha preocupação em ser revistada por um policial violento, ouvi dela que " você(eu) não se veste como um desses meninos, você não seria confundido com eles". Neste dialogo, fui diferenciada de garotos que assumiam uma estética associada à traficantes. Percebo que desde então, assim como minha avó, venho pensando cirurgicamente em cada detalhe que compõe minha estética; cores, modelagens, materiais dos acessórios, cabelo, gestos, tonalidade de voz, modo de andar e recentemente maquiagem. O racismo e a homofobia também produziram em mim esta preocupação.

Minhas angustias e meus deleites provocados pelas inúmeras estéticas que fabriquei, me conduziram a desejar uma maquina de costura, que ganhei do meu avô, em meu aniversário de 18 anos. Contudo, antes de ganhar a tal máquina, desde meados do meus 13 anos, eu ja produzia alguns roupas; algumas, com auxilo de costureiras. Tais afetos também contribuíram para a decisão de cursar psicologia, pois entro neste curso com um desejo de investigar a importância da estética nos processos identitários de tribus urbanas.

Tal análise, não deve ser confundida com um diagnóstico sobre minha vida, por onde eu culpo vovó pelas minhas preocupações com as formas pela quais apresento-me no mundo. O que faço aqui, é uma cartografia de minha existência, que organicamente possui 21 anos, mas que também é composta por outras temporalidades. Eu sou um ponto de intersecção, onde dispositivos de diferentes sociedades encontram-se, e produzem em mim vontades, prazeres e duvidas.

Através dessa cartografia existência, estou conseguindo relembrar as coreografias afetivas que criei até agora, e como tais movimentos produziram o que hoje nomeio de próteses. Essas próteses são obras de arte, e também releituras de todos os objetos (indumentários ou não) em quais me acoplei ou desejei acoplar-me em algum momento. Roupas, cordões, aneis, relógios, chaves, artigos para cabelo, e em especial as plantas naturais e sintéticas.

Hoje, me sinto em uma intensa simbiose os matérias orgânicos que são produzidos pela terra, fogo, água e ar. Consequentemente, tais relações comparece em minhas obras, e as garantem uma efemeridade que foi difícil respeita-la. Por muito tempo tive desejo de eternizar minhas próteses feitas apenas com plantas, para isso fiz testes com silicone, cola e latex. Nenhum deu certo, e hoje tenho apostado no caminho inverso, ou seja, tenho produzido com o tempo da matéria, que também fala do meu tempo. Minha corporeidade não é eterna, e mesmo que eu tente faze-la eterna com auxilio de fotografia e vídeo, esterei novamente me perdendo numa idealização utópica.

Tenho tentado pensar que meu trabalho sobreviverá de outro modo, e para isso uso sim a fotografia e o vídeo. Por criar próteses orgânicas, venho registrando elas com essas técnicas, além de também produzir registros afetivos no corpo na memória da pessoas que assistem minhas performances feitas com as próteses. Pois, são objetos, os mediadores que nos conectam à lembranças.

As sociedades do Vale do Omo (localizado na Etiótipa), tem me ajudado a respeitar o tempo desses materiais orgânicos com os quais venho produzindo armas e armaduras. Benzedeiras, candomblecistas, umbandistas, curandeiros, acadêmicos, artistas, amigos e família também me ensinam sobre cuidado. Além de entidades e corporeidades localizadas num passado que não estive, mas que os sinto quando acesso outros planos de minha existência. 

Bem, exatamente hoje desenvolvi boa parte de uma prótese feita barbante e um pedaço de látex. O barbante foi utilizado com a técnica de macramê. E a peça de latex, é um molde de meu braço em tamanho real. Chego em casa, visto a prótese, posiciono-me de frente ao espelho e a crio. Esse tem sido meu processo criativo. Um processo que criação que desenvolve-se na produção de uma estética que dialogue modo saudável com meu corpo. Ainda não sei muito bem falar sobre ela, pois ainda esta em produção. O que consigo apontar é que esta prótese esta sendo pensada para ser usada no mar. Aproprie-me da estética da rede de pesca. Com ela pesco minha um fragmento de meu corpo. Quando eu estiver executando o trabalho no mar, a prótese conterá plantas especificas daquele ambiente.

Em resumo, digo então que próteses são toda matéria  que anexo em meu corpo, e que me ajudam a ouvir, enxergar e sentir de outros modos. As próteses me potencializam, me protegem e me relançam no mundo. 



quarta-feira, 16 de maio de 2018

dores cansaços e esgotamentos

mergulhei em mim
já me afoguei em mim
afundei no mar de minhas memórias
pesquisei histórias
a água do meu corpo é salgada
e tem gosto de alecrim

sou mar, com sede de rio
sou nascente

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a subalternização se limpa(?)
com aroeira e água salgada
minha pele, é suja?
minha pele, se limpa?
o que suja minha pele?
qual cor da sujeira?
qual crd da minha pele?

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como expectorar silenciamentos 
aglutinados em minha garganta?
o que impede minha fala?
EU VOU GRITAR
tentaram me calar 
EU VOU GRITAR
oralidade é ciência?


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EU TE VI. VOCÊ ME VIU 
eu te denunciei
você mandou olhar com outros olhos
não me é possível olhar com outros olhos 
eu tenho certeza que te vi
meus olhos estão cansados 
mas não consigo dormir 
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MASSAGEIE O MÚSCULO SEM ALMA
MASSAGEIE OS OMBROS DA FERA
MEU MÚSCULO DÓI
meu músculo, pode doer? 
O QUE VIOLENTA MEU MÚSCULO?
sou forte e frágil, como uma arnica
MEU MÚSCULO DÓI
MEU MÚSCULO PODE DOER ?

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MEU CORPO VIBRA 
eu vibro em outra frequência

idealizar faz o corpo travar 
destravo-me com o som do atabaque
idealizar me desespera
não me faça idealizar
acalmo-me com água de camomila

cicatrizar no molhado

Cicatrizar no molhado é doloroso. Consegue imaginar um ferimento exposto à àgua salgada? que torna-se vermelha ao banhar-se de sangue do corpo violentado. Este sal é negro, da corpo de minha pele. É ele quem sara as feridas que o garante essa preciosa coloração.  Por cicatrizar-me no mar, me torno mergulhadora. Sou então um corpo feito de areia e ondas violentas. Torno-me aquática. 
O processo de se curar no mar é lento e profundo. Quando entro no mar, mergulho em temporalidades distintas que reconectam-se em mim.  Eu sou um vínculo entre o passado e o futuro. É no meu corpo d'agua onde ancestralidades naufragadas emergem à superfície - que é minha pele.

quarta-feira, 2 de maio de 2018

para dores, cansaços e esgotamentos

Criei um conjunto de mandingas, para amenizar dores de corpos violentados pelo racismo. Silenciamentos, apagamentos, sequestros, perdas, genocídios. O adoecimento é uma experiência psíquica-corpórea. A saúde dos violentados, demanda modos de cura que estejam atentos para pontos específicos de nossos corpos, pois as dores da alma são sentidas na pele, carne e osso. silenciamentos fazem a garganta doer. Em nossos gestos, há pensamentos. E o pensamento, se produz no movimento do corpo. Sob orientação de uma benzedeira negra, utilizei do passado para compreender o presente e produzir temporalidades e corporeidades mais saudáveis.